Currículo Nacional, bom ou ruim

Currículo Nacional, bom ou ruim

Currículo Nacional - ruim sem ele, pior com ele

"Um novo currículo se faz ao longo de anos, dois a três pelo menos. Aqui se fez em inexplicáveis dois meses", afirma João Batista Araújo e Oliveira

Fonte: O Estado de S. Paulo (SP)      17 de novembro de 2015

Este artigo é ao mesmo tempo um alerta e uma convocação. O alerta está no título. Para fundamentar a convocação, ao final, preciso,antes,apresentar os argumentos. Faço-o comparando a experiência dos países onde a Educação funciona com a proposta recém-apresentada pelo Ministério da Educação (MEC). O limitado espaço força a concisão, para o que conto com a benevolência do leitor.

Um novo currículo se faz ao longo de anos, dois a três pelo menos. Aqui se fez em inexplicáveis dois meses. Um currículo se faz com debate.Muito debate. Muita discussão. Aqui não houve nada, parece que somos todos como Forest Gump. No máximo, abriu-se a possibilidade de sugestões via e-mail para um buraco negro. Universidades e associações científicas, assim como as ONGs, omitiram-se.

Lá fora, os convocados para elaborar e discutir as propostas normalmente são pesquisadores e profissionais das áreas específicas, especialistas em currículo e estudiosos do desenvolvimento e da aprendizagem. Eles assinam o documento, até mesmo registrando divergências. Aqui temos um documento órfão e anônimo, de um consenso e uma uniformidade típicos do pensamento único.

O MEC lava as mãos. Um currículo se concentra no essencial que todos devem aprender.Aqui não sabemos sequer se o proposto esgota os tais 60% da carga horária ou se é algo a ser trocado ou ampliado. No geral, um currículo é nacional. Aqui não sabemos a quem compete definir os conteúdos dos tais 40% restantes. Um currículo apresenta articulação explícita entre os níveis de Ensino. Não é o nosso caso.

Todos os países têm currículos diferenciados para o Ensino médio; de novo, aqui não. Nem sequer se sabe se a formação profissional estaria incluída nos 40%. Um currículo é feito de forma articulada com a formação de Professores e com a capacidade dos Professores existentes de entendê-lo e de o pôr em prática.Aqui se imagina um Professor que não existe.

Em outros países o currículo é também pensado para tornar viável a produção de livros e materiais didáticos com diferentes perspectivas e abordagens. No nosso há forte amarração ideológica, o que tornará os livros didáticos politicamente corretos,mas com pouca orientação sobre o que deve ser ensinado e aprendido. Currículos são pensados em articulação com propostas de avaliação, inclusive internacionais, como as do TIMSS e do Pisa.

Se vingar a proposta do MEC, nosso desempenho nesses testes deverá piorar. Finalmente,um currículo deve ser avaliado a partir de três critérios: foco, rigor e coerência.A maioria das propostas para as diferentes disciplinas não passa nesse teste. Mas, afinal, o que há de tão ruim nessa proposta? Exemplos ajudam o leitor a avaliar o monstrengo diante do qual nos encontramos.

Na Educação infantil é fundamental assegurar o pleno desenvolvimento das crianças,com base no que sabemos sobre a ciência do desenvolvimento humano. Mas a proposta não trata disso, fala de direitos éticos, políticos e estéticos.Educação infantil só faz diferença, especialmente para os mais pobres, com currículos rigorosos. Quem cuidará isso? Municípios?Escolas?Cada Educador?

A proposta nem sequer fala em preparação para alfabetizar. E confunde a forma de aprender das crianças – brincar – com objetivos, conteúdos ou direitos. Muita ideologia para pouca psicologia.

A Alfabetização continua maltratada. Caligrafia não foi incluída, quando se sabe de seu papel fundamental no processo de aprendizagem. Digitação, sim! Bem-vindo à Finlândia! Fluência de leitura é tema ignorado na proposta.

O termo Alfabetização não é definido de maneira correta e no seu sentido próprio, mas é usado de forma genérica e inútil, para falar em Alfabetização matemática, científica ou estética. Muito engraçadinho, talvez, mas apenas isso. Já o letramento perdeu seu caráter de gêmeo siamês da Alfabetização, mas agora se aplica a todas as disciplinas. Academia Brasileira de Letras, vinde em nosso auxílio!

O currículo de Língua Portuguesa continua a tradição dos parâmetros curriculares nacionais (PCNs) de privilegiar os usos sociais da língua. Só que agora os “usos sociais” reinam absolutos; a gramática deve ser ensinada quando e como o Professor julgar relevante. Isso é pós-moderninho? De tudo, a proposta da Língua Portuguesa é a mais trágica.

O currículo de Matemática é melhorzinho,mas não há previsão para ensinar e aprender fatos fundamentais: avelha, boa e essencial tabuada, nem as propriedades das operações – fragmentos disso aparecem no sétimo ano. Há tópicos introduzidos muito cedo,como os problemas orais, e outros muito tarde, como o uso da reta numerada.

O currículo de ciências também sucumbiu à conveniência dos usos sociais. Em vez de se ancorar em poucos conceitos científicos sólidos, a proposta devaneia num parque temático.Ter opinião é preciso,formular hipóteses e desenvolver espírito crítico, idem. Mas compreender conceitos científicos com rigor não é preciso.

Para ilustrar um de inúmeros problemas ideológicos, escolho a questão do respeito dos “saberes”do Aluno.Na proposta isso é supervalorizado em detrimento da função da Escola, que é a de ensinar,e da centralidade de uma abordagem pedagógica que ajude o Aluno a identificar, justificar e aprender a partir do erro.

Há imensa literatura sobre estratégias eficazes para identificar e lidar com concepções matemáticas e científicas equivocadas ou com erros ortográficos ou lógicos. Esse é um dos inúmeros conceitos politicamente corretos que constituem a espinha dorsal do novo currículo. Se você também não está feliz com essa proposta,manifeste-se. Ouse.

Procure a mídia ou as ONGs, a Academia Brasileira de Ciências ou até escreva para o ministro da Educação. Peça que ele esclareça as questões levantadas neste artigo. Provo que o debate. No mínimo,escreva para o autor, dando ideias e contribuições para o debate (joao@alfaebeto.org.br).

*PRESIDENTE DO INSTITUTO ALFA E BETO

 

Especialistas defendem em Campinas (SP) mudanças na proposta da Base Nacional Comum Curricular

Uma das críticas ao texto foi com relação à proposta de fixação de 60% da Base como comum a todo território nacional, enquanto 40% seriam destinados a conteúdos diversificados

Fonte: Compromisso Campinas pela Educação (SP)  13 de novembro de 2015

Mudanças na proposta da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que está em discussão em vários segmentos sociais, a partir de um documento formulado pelo Ministério da Educação, foram defendidas na manhã desta quinta-feira, 12 de novembro, por especialistas que participaram de evento da 6ª Semana da Educação de Campinas. O evento “Desafios e perspectivas para a construção da Base Nacional Comum Curricular” aconteceu no auditório da Fundação FEAC.
A 6ª Semana da Educação de Campinas é uma iniciativa da Fundação FEAC, no âmbito do Compromisso Campinas pela Educação (CCE). Até o dia 13 de novembro, sexta-feira, serão 15 eventos, para diferentes públicos, em diversos espaços, em torno da bandeira Valorização da Escola. Todos os eventos contam com intérprete de Libras.

Propostas de modificações na BNCC – Participaram do evento na manhã desta terça-feira em Campinas o professor emérito do Instituto de Física da USP, Dr.Luiz Carlos de Menezes, que é um dos assessores para a construção da Base Nacional Comum Curricular; Maridalva Oliveira Amorim Bertacini, representando a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime); e o jornalista e matemático Ricardo Falzetta, gerente de conteúdo do Movimento Nacional Todos pela Educação. O debate foi mediado pela professora Dra.Maria Inês Fini, coordenadora do Comitê Deliberativo do Observatório da Educação do CCE.

Uma das críticas ao texto-base da BNCC foi com relação à proposta de fixação de 60% da Base como comum a todo território nacional, enquanto 40% seriam destinados a conteúdos diversificados, considerando a realidade e a cultura local e regional, considerando a extensão do país e a grande diversidade existente na sociedade brasileira.

Para o professor Luiz Carlos Menezes, a BNCC deveria ser “um documento enxuto”, muito menor portanto do que a proposta original, de mais de 300 páginas, “com apenas o essencial” que deveria valer para todo território nacional, e a partir daí “o currículo seria adequado à realidade local, respeitando a riqueza da diversidade brasileira”.

Na opinião da professora Maridalva Oliveira Amorim Bertacini, que é coordenadora pedagógica na rede municipal de São José do Rio Preto, a BNCC também deveria ser um documento com 100% válido para todo território brasileiro, com o currículo sendo então aplicado em cada escola “respeitadas as especificidades e a autonomia de cada município e cada projeto político pedagógico”.

O representante do Todos pela Educação lembrou que “a Base Nacional Comum Curricular é uma Base, não é o currículo”, e nesse sentido a proposta do 60%/40% “perde o sentido”. Ele também defende a consideração das especificidades locais.

Também foram feitas críticas ao conteúdo proposto na BNCC para a Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. Para o professor Menezes, “não foi respeitada uma gradação do desenvolvimento da criança” no âmbito da proposta para a Educação Infantil. Ele também entende que em termos do Ensino Fundamental e Médio “não houve uma articulação entre os conteúdos, e isso é fundamental considerando que o aluno é um ser completo, não é apenas cérebro, ele também é corpo, é afetividade”.

A representante da Undime fez um convite para que “a proposta da BNCC seja amplamente debatida nas escolas, e que o debate envolva as famílias, os alunos, os professores, coordenadores e gestores”, e que o fruto da proposta seja encaminhado no portal aberto pelo Ministério da Educação para receber sugestões. O portal tem este endereço: http://basenacionalcomum.mec.gov.br

O jornalista e matemático Ricardo Falzetta lembrou que foi o Movimento Nacional Todos pela Educação que apresentou a emenda para que o Plano Nacional de Educação incluísse a necessidade de definição de uma Base Nacional Comum Curricular. Ele destacou, contudo, que a BNCC “não deve ser vista como a salvação da Educação no Brasil, pois ela deve ser inserida em um sistema que necessita melhor formação e valorização do professor e melhor infraestrutura para as escolas funcionarem”. A professora Maria Inês Fini pediu atenção especial para o Ensino Médio, que em sua opinião foi distorcido pelo novo formato do ENEM.

Educação inclusiva e sustentabilidade – Dois eventos foram realizados na tarde de quarta-feira, 11 de novembro, dentro da 6ª Semana da Educação de Campinas. Às 14 horas, o auditório da FEAC recebeu o evento “Gestão pedagógica na perspectiva das diferenças”, com Marília Costa Dias.

Ela defendeu a necessidade de as escolas se prepararem para a valorização da diversidade, que é a característica da população brasileira. “O normal é a diversidade e não o contrário”, sustentou. E ela acredita que “a escola sozinha não dá conta” de trabalhar com a diversidade. Os saberes de outras instituições e setores também devem ser considerados, de modo que efetivamente seja respeitada, valorizada e trabalhada a diversidade.

Outro evento de sucesso dentro da Semana da Educação foi a cerimônia de premiação do programa “Nosso planeta, nossa casa”, desenvolvido pela Junior Achievement, com apoio da Fundação Educar Dpaschoal e PPG. Durante o evento, representantes de diversas escolas públicas de Campinas mostraram o trabalho desenvolvidos com os alunos e receberam certificado de capacitação.

No total foram 100 educadores capacitados e 3 mil alunos atingidos pelo programa em 15 escolas. “Estar aqui hoje para apresentar nosso trabalho é muito gratificante. Cerca de 450 alunos participaram e o envolvimento de nossa escola foi total. A sustentabilidade é um tema muito valorizado em nossa escola”, resumiu Jaqueline Salione, coordenadora pedagógica da Escola Estadual Professor Luiz Gonzaga Horta Lisboa.

Educação Integral e Assistência Social – As perspectivas de uma ação conjunta entre Educação Integral e Assistência Social foram discutidas em evento na noite desta quarta-feira, 11 de novembro, no teatro do SESI-Amoreiras, como parte da 6ª Semana da Educação de Campinas.

O psicólogo e mestre em Sociologia Política Célio Vanderlei de Moraes enfatizou o enorme potencial de uma ação conjunta entre Educação Integral e Assistência Social, como estratégia para o desenvolvimento humano integral em uma comunidade, sobretudo em área de alta vulnerabilidade social.

De modo especial, Moraes destacou a possibilidade de um diálogo mais próximo, visando ações efetivas, entre os Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) e as escolas de uma determinada comunidade. Pela Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais, os Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos são entidades e grupos organizados que atuam na ampliação de trocas culturais e vivências, de modo a prevenir situações de risco social. Em Campinas, por exemplo, são mais de 120 organizações conveniadas atuando como SCFV.

Esses Serviços, acentuou o psicólogo, podem identificar temas relevantes no seu território de atuação e que podem ser utilizados como objeto de estudo e ação pelas escolas daquela comunidade. “Ações compartilhadas são possíveis e necessárias. Os Serviços de Convivência têm a expertise de trabalhar com as famílias em situação de vulnerabilidade e que são a origem de alunos que estudam nas escolas. As escolas, por sua vez, têm a capacitação pedagógica”, lembrou. Para Célio Vanderlei de Moraes, a atuação compartilhada entre escolas e Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos permite de fato uma Educação Integral, transcendendo as ações que eram realizadas no chamado contraturno escolar por entidades sociais.

Por sua vez, a pedagoga e mestre em Educação Juliana Gomes dos Santos resgatou a evolução do debate em torno da Educação Integral no Brasil, desde as Escolas-Parque de Anísio Teixeira na década de 1950 até os CIEPS de Darcy Ribeiro nos anos 1980 e as reflexões de Paulo Freire sobre as diferentes dimensões da Educação: ético-política, técnico-científica, epistemológica, estético-afetiva e pedagógica.

São as dimensões, afirmou, que devem ser consideradas por uma Educação Integral, visando o desenvolvimento humano integral. Juliana observou que a Educação em Tempo Integral não é necessariamente Educação Integral. “É possível fazer Educação Integral em Tempo Integral ou não, assim como a Educação em Tempo Integral pode praticar ou não a Educação Integral”, lembrou.

Outros dois convidados participaram do debate. Luiz Carlos Cappellano, coordenador do Comitê Metropolitano de Educação Integral da Região Metropolitana de Campinas, destacou que o Programa Mais Educação, na RMC desde 2009, vem se esforçando para a mobilização e construção de Cidades Educadoras. E o conceito de Cidades Educadores, ressaltou, pressupõe que todas as instituições e organizações dessas cidades, e não apenas as escolas, são potencialmente educativas. Ele se disse favorável a “quebrar os muros das escolas”, rumo a uma forte ligação entre essas unidades e a comunidade onde estão situadas.

Uma experiência concreta de atuação de Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos foi narrada por Luiz Mendes, do Projeto Gente Nova (Progen), organização que atua há 31 anos na Região da Vila Castelo Branco. Ele contou, entre outras, a experiência de revitalização da Praça do Trabalhador, como fruto da ação conjunta de jovens do Progen e das escolas e outras organizações da região. Um exemplo da parceria entre Educação e Assistência Social.

Programação do dia 13 de novembro – No dia 13 de novembro, sexta-feira, às 9h, na sede da FEAC, acontece o inédito evento “O papel da mídia nos desafios da educação”, com a mediação do jornalista José Pedro Martins e comentários de Fabiano Ormaneze, graduado em Jornalismo, mestre em Linguística e professor da PUC-Campinas.

Já às 15h, a Escola Estadual Orlando Signorelli, localizada na Região dos DICs, uma das mais populosas de Campinas, vai sediar o evento “Valorizar a escola é valorizar a sociedade”, com a participação de André Gravatá, grêmios escolares e jovens engajados com a educação pública. Também participarão ex-alunos da Escola Estadual Professor Alves Cruz, que protagonizaram um movimento para evitar o fechamento da unidade escolar, localizada na capital paulista.

O Grupo Pererê, por sua vez, será responsável por intervenções artísticas no evento. O Pererê é uma produtora colaborativa, que atua com a produção artística em escolas. Será um grande espaço para Campinas ouvir o que os jovens estão fazendo pela educação na cidade. Também haverá atrações culturais, fechando oficialmente a 6ª Semana da Educação de Campinas.

Patrocinadores e apoiadores – Os patrocinadores da 6ª Semana da Educação de Campinas são Grupo DPaschoal, Empresas do Grupo Graber e Shopping Center Iguatemi. A Semana tem o apoio da Prefeitura Municipal de Campinas, Secretaria da Educação do Governo do Estado de São Paulo, Vitória Hotel Concept Campinas, Fundação Educar DPaschoal, Sesi Campinas e movimento nacional Todos Pela Educação.

São parceiros divulgadores da 6ª Semana da Educação de Campinas: Clear Channel, Educativa FM, EPTV Campinas, Grupo Bandeirantes de Comunicação, Grupo RAC, Portal Campinas.com.br, Shopping Iguatemi Campinas, Rádio Brasil Campinas, TV Câmara Campinas e TVB Record. Estes veículos gentilmente estão exibindo e divulgando as peças da campanha publicitária que é composta por vídeo, spot de rádio, cartazes, folders, panfletos, outdoors, anúncios de jornal/revista e banners, além de mídias para ambientes online.

Compromisso Campinas pela Educação – O Compromisso Campinas pela Educação foi lançado em 2007, sob liderança da Fundação FEAC, com o propósito de mobilizar a sociedade civil a fim de chamar a atenção para a causa e o tema Educação, evidenciando dados, promovendo estudos, discussões e debates acerca da qualificação da educação, especialmente na cidade de Campinas (SP).




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