Carta de Fortaleza

Carta de Fortaleza

Saberes para uma cidadania planetária.

Carta de Fortaleza II

Fortaleza (Ceará) Brasil. 27 de maio de 2016

Carta de Fortaleza Saberes para uma Cidadania Planetária clique aqui em pdf

Preâmbulo

Cada vez mais gravemente, a existência de uma crise civilizatória afeta a saúde individual e coletiva, compromete nossa sobrevivência como espécie e, ao mesmo tempo, destrói as bases éticas de nossa convivência social.  Uma crise como essa adquire visibilidade nas seguintes constatações:

  • Proliferação da corrupção política e econômica, geradora de uma cultura cada vez mais individualista;

  • Excessos de uma economia financeira sem nenhum tipo de controle social, que promove a acumulação sem limite de bens;

  • Crueldade e a falta de solidariedade com milhões de refugiados que fogem das guerras em seus países;

  • Persistência de culturas sociais e regimes políticos que marginalizam, depreciam, perseguem e violentam a dignidade humana, seja por sua condição econômica, cultural, étnica, religiosa, sexual;

  • Desproteção, desamparo e vulnerabilidade de camadas sociais responsáveis pelo aumento da pobreza, da precariedade e da desigualdade social.

 Como bem sinaliza Edgar Morin, esta crise é também cognitiva, emocional, espiritual; os pensamentos científico e humanístico dominante não vem sendo suficientemente capazes de relacionar, integrar, contextualizar o conhecimento em conjuntos de sentidos mais coerentes com a complexidade do real. Aprisionada pela simplificação, determinismo, reducionismo e maniqueísmo, essa crise cognitiva não contempla o erro e a ilusão, que endurece ideias e pensamentos e confunde racionalidade com racionalização; não é capaz de identificar as relações e as interdependências dos problemas sociais e naturais, entre partes e o todo. Em nome de uma suposta objetividade, ignora e despreza o sujeito negligenciando sua condição humana, sua necessidade de compreensão afetiva e amorosa, sua identidade terrena, relega valores éticos universais, como a responsabilidade e a solidariedade, a funções meramente decorativas, secundárias e desnecessárias à construção do conhecimento.

 Além de se expressar em catástrofes ambientais, movimentos migratórios, guerras, fome, desemprego, corrupção, pobreza e desigualdade social, esta crise está também associada a uma “crise do ser”, que se manifesta na deterioração da saúde mental em todo o mundo, na ampliação de psicopatologias sociais e individuais vinculadas a depressões, ansiedades, pânicos, medo, vitimização, infantilismo, como assinalado por inúmeros profissionais de várias áreas do saber.

Estas crises engendram relações sociais baseadas na acumulação, na ganância, na distribuição desigual da riqueza, na exploração ilimitada da natureza, assim como em crenças, atitudes, condutas individuais que refletem uma estrutura patriarcal da mente e das relações humanas, que privilegia a agressão sobre a ternura, a dominação sobre a liberdade, a competitividade sobre a cooperação, a violência e a guerra sobre a compreensão e a paz, a razão sobre a emoção,  o masculino sobre o feminino, a religião sobre a espiritualidade, a ciência sobre a consciência, a eficiência e a eficácia sobre o bem-estar, o bem-viver, o bem-ser.

Conscientes de nossa responsabilidade social, nós, conferencistas e assistentes da Conferência Internacional sobre os Saberes para uma cidadania planetária, promovida pela Universidade Estadual do Ceará, em colaboração com a Universidade Católica de Brasília, a UNESCO e com outras universidades nacionais e internacionais, unidos em Assembleia, no dia 27 de maio de 2016, em Fortaleza/Ceará/Brasil, concordamos em tornar pública a presente Carta de Fortaleza II, sobre Saberes Educacionais para uma Cidadania Planetária.

Aproveitamos a oportunidade para valorizar e agradecer o imenso legado de Edgar Morin. De modo extraordinário, sua obra para a criação e a proposição de novas visões, estratégias e apostas para a emergência de uma cidadania planetária e de uma nova civilização pautada na sustentabilidade, na justiça, na solidariedade, na democracia e na paz. Admiramos e o congratulamos, em especial, pelos seus aportes para o desenvolvimento de uma Política de Civilização, para a construção de um Pensamento do Sul e a proposição de reformas paradigmáticas e programáticas necessárias à Educação do Século XXI, em destaque as propostas sugeridas em sua magnífica obra “A via para o futuro da humanidade”.

Todos os participantes desta Conferência reconhecem o mérito, a excelência, o esforço de Edgar Morin em prol da compreensão da condição humana, da promoção dos valores éticos de responsabilidade e solidariedade, da criação de uma epistemologia mais coerente com os avanços da ciência e do conhecimento humano.  Com carinho, admiração, gratidão, esta Conferência rende homenagem à sua pessoa e sua obra, reconhece-o como um dos pensadores mais brilhantes dos séculos XX e XXI, que mais tem contribuído para a reforma do pensamento e a criação de uma nova forma de compreender e realizar a educação.

Considerações

  1. Ratificamos o nosso compromisso com os Sete Saberes para uma Educação do Futuro propostos por Edgar Morin, reconhecemos a importância das recomendações contidas na Carta de Fortaleza por uma Educação Transformadora, de setembro de 2010 e no documento Para um Pensamento do Sul, publicado pelo SESC, em 2011. Esses documentos ratificam a necessidade de se criar espaços educacionais dialógicos, reflexivos, criativos e democráticos, formais ou não formais, capazes de viabilizar o surgimento de práticas educacionais pautadas na solidariedade, na paz, na justiça social, na democracia e no bem viver. Assumimos a importância e o compromisso com o conhecimento da condição humana, com a prática e o desenvolvimento da compreensão e da ética como caminhos privilegiados para enfrentar as crises sociais, econômicas, políticas e ambientais atuais que colocam em risco a sobrevivência humana e a preservação da vida no planeta;

  2. Reconhecemos o valor e a importância das práticas sociais, políticas e educacionais baseadas na compreensão humana, na ética e nos valores do cuidado, do afeto, da amizade e da solidariedade. Denunciamos todas as situações, estereótipos, costumes, condutas sociais, institucionais e individuais, que marginalizam, discriminam, violentam e humilham as mulheres;

  3. Entendemos que a responsabilidade de educar é tarefa de toda a sociedade, de todas as instituições, estabelecimentos e lideranças sociais, profissionais, políticas e intelectuais. Apostamos na realização e no desenvolvimento de experiências, iniciativas, projetos educacionais e práticas docentes baseadas numa cultura profissional cooperativa, dialógica, participativa, de ajuda mútua e de responsabilidade social;

  4. Concordamos que é urgente e necessário “curar a civilização”, como exorta Claudio Naranjo, a partir de uma transformação profunda da educação, baseada em fundamentos epistemológicos e ferramentas cognitivas que provoquem mudanças interiores que nos ajudem a pensar sobre o nosso pensar e a melhor compreender as emoções humanas, para poder transformar a realidade. Urge uma educação que permita o reconhecimento de nossas psicopatologias sociais e individuais, de nossas tendências emocionais destrutivas produzidas por padrões de conduta de uma sociedade enferma. Repensar a educação implica contribuir para o autoconhecimento, a compreensão da vida coletiva, a promoção de uma vida emocionalmente mais saudável e socialmente mais justa;

  5. Reconhecemos que a democracia é, sobretudo, um espaço de convivência, comunicação e colaboração no qual os indivíduos possam exercer sua autonomia, criatividade, responsabilidade e solidariedade, a partir do respeito mútuo, do cultivo de valores éticos universais inspirados na dignidade e na igualdade essencial a todos os seres humanos;

  6. Reiteramos que uma educação verdadeiramente democrática é, antes de tudo, um processo de transformação permanente na convivência, baseado no respeito mútuo e no reconhecimento do outro em seu legítimo outro e que, para conseguir realizar uma educação verdadeiramente democrática é necessário criar espaços de diálogo, comunicação e reflexão nas escolas que permitam conhecer, compreender e garantir o pleno desenvolvimento dos Direitos Humanos Universais;

  7. Concordamos que o conceito de cidadania planetária implica a consciência/vivência de direitos e deveres dos cidadãos podendo ser compreendido de múltiplas formas, em função das complementaridades das dimensões a dimensão social, cultural, política, econômica. Qualquer cidadão pertence a uma comunidade política que o acolhe e com a qual se identifica e se compromete. Além de integrar valores de justiça e identidade, o conceito de cidadania inclui também a complexa mescla de igualdade, liberdade, participação, diálogo, responsabilidade e solidariedade, o compromisso em relação aos projetos comuns que consolidem ‘nossa humanidade comum’, nossaunidade na diversidade’, ‘nosso futuro comum e nossa pátria comum’, nossa ‘terra-pátria’, como pretende Edgar Morin;

  8. Nossos Direitos Humanos Universais não podem ser garantidos e nem sustentados se não garantirmos e sustentarmos os Direitos da Terra e da Mãe Natureza. O conceito de cidadania planetária precisa ser compreendido a partir de uma ecologia integral, que exige uma concepção epistemológica complexa e transdisciplinar para a compreensão de sua verdadeira multidimensionalidade;

  9. Comungamos com as palavras do Papa Francisco que, em sua Encíclica ‘Laudato si’ (2015), questiona o lugar do ser humano na contemporaneidade, observando que a interdependência de todos com todos deveria nos levar a pensar em um só mundo com um projeto comum voltado para o cuidado com a natureza e a defesa dos pobres, lembrando que o meio ambiente é um bem coletivo, um patrimônio de toda humanidade, uma responsabilidade de todos nós;

  10. Uma alternativa possível é a construção de uma cidadania planetária que promova uma mundialização mais cooperativa e solidária, que defenda os interesses dos povos, que respeite suas tradições, que promova a integração da diversidade cultural da humanidade, que reconheça nossa morada comum e compreenda que as diferenças que nos separam são decorrentes de um paradigma civilizatório produtivista, insustentável e de nossa ignorância e incompreensão a respeito das dinâmicas biocêntricas e das complexas leis constitutivas da vida;

  11. Esta compreensão exige mudança de valores, atitudes e comportamentos por parte de cada um de nós. Exige mudança de consciência, bem como o desenvolvimento e a evolução do espírito humano em direção a uma ética mais solidária e compassiva. Requer mudanças interiores, envolvendo a mente e a alma humana, acompanhadas por mudanças exteriores e institucionais que se convergem e se consolidam, além de compromissos individuais e coletivos firmes e sustentáveis, capazes de planejar estratégias de transformação e desenvolvimento social e comunitário;

  12. Estamos conscientes de que a reforma do pensamento e das instituições não acontece sem uma transformação mais profunda de natureza paradigmática, o que certamente pressupõe novas perspectivas ontológicas, epistemológicas e metodológicas a serem trabalhadas, sem o que não conseguiremos aprender a pensar e compreender o humano, o contexto, o complexo e o transdisciplinar;

  13. A formalização e aplicação dos saberes para uma cidadania planetária só serão possíveis a partir da desburocratização generalizada capaz de distinguir racionalidade e racionalização, de promover a autonomia, a criatividade, a responsabilidade e a solidariedade aos profissionais Uma educação verdadeiramente democrática e solidária só se efetivará se docentes, discentes, familiares tenham possibilidades reais de conviver, dialogar, refletir e trabalhar juntos criativamente em prol de um projeto comum de autorrealização e desenvolvimento humano;

  14. Consideramos que a formação docente é a pauta mais prioritária e urgente para responder aos desafios de nossa realidade atual e construir os saberes para uma cidadania planetária. É condição essencial para melhoria da qualidade da educação e, consequentemente, para a construção de uma nova política civilizacional, capaz de afrontar as múltiplas crises que ora afligem a humanidade. Entendemos que os cursos e processos de formação docente necessitam ir além dos modelos de racionalidade técnica, de racionalidade prática e de racionalidade crítica;

  15. Entendemos que fundamentos e bases teóricas claras são vitais não apenas ao que se refere aos processos de construção do conhecimento e à aprendizagem, condição fundamental para o exercício de sua docência, mas também para a compreensão a respeito do funcionamento do mundo e da vida. Sem isto, fica difícil para o professorado compreender e explicar o que conecta o mundo físico à realidade vivente e aprendente, o mundo vivo à vida em sociedade e esta aos domínios da mente e da cultura;

  16. Concordamos com Edgar Morin que, como humanidade, precisamos de um pensamento complexo, ecologizado, capaz de relacionar, contextualizar e religar os diferentes saberes e as dimensões da vida. Necessitamos de mentes mais abertas, de escutas mais sensíveis e solidárias, de pessoas criativas, responsáveis, éticas e comprometidas com a transformação de si e do mundo ao seu redor. Precisamos desenvolver pensamentos, sentimentos e ações mais congruentes e coerentes com as necessidades humanas e, mais do que nunca, necessitamos de educadores e docentes competentes, comprometidos e apaixonados por sua profissão, além de políticas educacionais mais eficazes e comprometidas, capazes de garantir o direito à educação e à diversidade das culturas e dos povos, bem como o direito à vida no planeta Terra.

Recomendações

  1. Para enfrentar a crise planetária na qual estamos imersos, é necessário gestar uma politica de civilização capaz de construir e desenvolver uma profunda transformação dos sistemas educacionais, no sentido de criar e nutrir outras perspectivas civilizatórias. Tal transformação deverá estar baseada, segundo Edgar Morin, em uma reforma do pensamento e em uma reforma da educação, pautada, entre outros aspectos, no desenvolvimento de uma democracia cognitiva;

  2. Para estabelecer uma política de civilização e desenvolver estratégias nacionais e internacionais que sejam úteis e sustentáveis no tempo e no espaço, necessitamos de grupos, organizações, instituições e cidadãos centrados nas necessidades concretas dos contextos e fundamentados em valores de autonomia, criatividade, responsabilidade e solidariedade;

  3. Para idealizar, desenvolver e aplicar os saberes dirigidos à construção de uma nova cidadania planetária e o repensar desta atual civilização, urge a presença ativa da solidariedade como valor central e transversal das mudanças e transformações necessárias. Uma solidariedade que se concretiza a partir de uma dupla dinâmica de processos integrados e interdependentes, implicando o desenvolvimento pessoal e o desenvolvimento grupal.

  4. Qualquer processo educacional, ou de aprendizagem transformadora e transdisciplinar, tem que ser compreendido como integração dinâmica dos processos de aprender a ser, aprender a conhecer, aprender a aprender e aprender a viver/conviver, acrescidos do aprender a comprometer-se e não mais como uma soma de conhecimentos especializados ou de disciplinas aprisionadas em suas gaiolas epistemológicas, burocráticas ou corporativas;

  5. Os saberes para uma cidadania planetária são ontológica e epistemologicamente transdisciplinares, devem ir além das disciplinas, exigem uma reforma do pensamento capaz de afrontar e superar os erros e as ilusões do conhecimento, do dogmatismo, do reducionismo, da descontextualização, da racionalização e da objetivação do ser humano. Essa ecologia de saberes se constitui a partir de uma combinação complexa entre saberes científicos e humanísticos, cognitivos e emocionais, éticos e estéticos, acadêmicos e tradicionais, naturais, sociopolíticos e espirituais;

  6. Os saberes ecológicos, éticos, sociais, políticos para uma cidadania planetária devem promover, garantir, ampliar e sustentar essas dimensões, em toda a sua diversidade. São saberes ecológicos porque combinam e integram complexamente a ecologia natural/ambiental, a ecologia social e a ecologia interior e pessoal. São saberes políticos e civilizatórios que denunciam as ameaças e os riscos de uma civilização baseada na expropriação, na corrupção, na ganância e no individualismo. Ao mesmo tempo, são saberes inéditos que, segundo Paulo Freire, viabilizam, propõem e constroem iniciativas, experiências, projetos e processos pautados pela autonomia, criatividade, responsabilidade, solidariedade.

  7. Recomendamos que os saberes para uma cidadania planetária tenham como um de seus objetivos principais o desenvolvimento pleno, integral e contínuo do ser humano, reconhecendo-o como ser único e habitante privilegiado deste planeta vivo, cuja manutenção, sustentabilidade e capacidade para afrontar os riscos e as ameaças da vida dependem de sua capacidade de transformação e de humanização;

  8. Recomendamos também que os novos saberes educacionais necessários a uma cidadania planetária tenham como referência principal os Sete Saberes para uma Educação do Futuro propostos por Edgar Morin, no sentido de levar em conta os operadores cognitivos da complexidade na hora de formular estratégias de transformação educacional;

  9. Reiteramos a necessidade do questionamento dos fundamentos ontológicos, epistemológicos e metodológicos dos currículos estabelecidos e propostos pelas administrações educacionais, no sentido de abrirem-se às descobertas mais atuais da ciência que nos ajudem a melhor compreender nossa condição humana e a dinâmica operacional dos processos de ensino e aprendizagem.

  10. Recomendamos que os questionamentos dos fundamentos curriculares devam colaborar para tentar superar, na prática, toda cultura seletiva, excludente, classificatória e fragmentadora do conhecimento, do funcionamento das estruturas organizacionais e dos tempos e espaços educativos. Recomendamos também a superação dos processos de avaliação sentenciadores que impedem que crianças, adolescentes e adultos sejam devidamente reconhecidos em seu processo contínuo de aprendizagem e desenvolvimento.

  11. Exortamos a necessidade de novas estratégias de abordagem curricular pautadas no reconhecimento da ação como estratégia, na vivência da dialógica, da multirreferencialidade, na participação compartilhada de experiências e na perspectiva intercrítica proposta por Henri Atlan, na qual o ‘pensar juntos’ possa se constituir num dispositivo fundamental para uma configuração curricular capaz de gerar sementes e iniciativas para a mudança do paradigma civilizacional construtor de uma nova cidadania planetária;

  12. Os docentes devem recuperar seu protagonismo e sua responsabilidade profissional como construtores de um currículo em ação, ao mesmo tempo em que estabelecem uma prática compartilhada e uma comunicação fluída, tanto com o mundo acadêmico das Ciências da Educação como com o mundo real das práticas educativas que, cotidianamente, se realizam nos mais diversos contextos e espaços educacionais;

  13. Para o ensino e o desenvolvimento de saberes para uma cidadania planetária, recomendamos que os processos de formação docente incluam a visão complexa, ecossistêmica e transdisciplinar da educação e dos processos e atividades educativas em sua dupla e inseparável vertente de ensino e aprendizagem. Esta é uma das condições necessárias para se contextualizar, analisar, solucionar os problemas e melhor compreender as atuais necessidades educativas, descobrir suas vinculações e interdependências;

  14. Recomendamos que os cursos de formação de professores, tanto de formação inicial como continuada, atentem para a necessidade de aprofundamento teórico e a melhoria das bases epistemológicas e metodológicas presentes nas práticas docentes, condição fundamental para melhor compreensão dos mecanismos funcionais do pensamento, do conhecimento e da ação humana e para a viabilização das reformas propostas por Edgar Morin;

  15. Entendemos que a complexidade e a transdisciplinaridade ampliam a maneira de pensar, compreender e mediar a formação docente, lembrando-nos de que, enquanto fenômeno, a formação não é exclusividade da pedagogia, pois a vida, em si, tem sua própria ‘formatividade’ ao trazer consigo vivências e experiências formadoras e potencializadoras de uma futura prática docente. Formação, educação e vida constituem processos interdependentes que se mesclam de maneira dialógica, recursiva, auto-eco-organizadora e emergente, nutridos por saberes científicos, filosóficos e existenciais mediados pela intencionalidade docente.

  16. Recomendamos que os processos de formação docente sejam concebidos em sua perspectiva complexa e transdisciplinar, portanto, global e multirreferencial, o que implica a vivência de processos de autoformação, heteroformação e ecoformação, como condição fundamental para o resgate da alma docente, para a reabilitação do sujeito e o desenvolvimento de sua autoria e autonomia profissional. Novas maneiras de educar para se viver/conviver neste mundo complexo, plural e digital nos ajudarão a promover a reforma do pensamento e a gestar uma política de civilização pautada na solidariedade, na responsabilidade, na convivialidade.

Palavras Finais

Para fomentar, promover e apoiar a supervisão e a consolidação das recomendações propostas no plano internacional solicitamos o apoio da UNESCO e de suas estruturas no sentido de:

  1. Informar aos Estados Membros e a seus diferentes órgãos os resultados obtidos nesta Conferência e, em particular, o conteúdo da presente Carta de Fortaleza II: Para uma cidadania planetária.

  2. Priorizar em suas políticas, programas e projetos a visão e o conteúdo propositivo presente na obra de Edgar Morin, em especial, ‘A via para o futuro da humanidade’, assim como as considerações e recomendações da presente Carta.

  3. Solicitar às autoridades governamentais e outros atores sociais que levem em conta as propostas contidas na presenta Carta no momento de planejar suas políticas educativas, culturais e sociais dirigidas a desenvolver e educar na responsabilidade social, na cidadania planetária e nos Direitos Humanos Universais.

  4. Recomendar e apoiar a criação de uma rede de cooperação interinstitucional e internacional capaz de colocar em marcha estratégias intensivas de formação de educadores, mediante o desenvolvimento de projetos compartilhados de pesquisa-formação-inovação, pautados na complexidade e na transdisciplinaridade e nos demais princípios que inspiram os documentos ‘Para um Pensamento do Sul’ e ‘Sete Saberes para uma Educação do Futuro’, visando à construção de uma nova política de civilização planetária.

  5. Ratificar a proposição feita no documento ‘Para um Pensamento do Sul’ no sentido de propor a criação de uma rede incubadora de ideias e experiências nutridoras de novos saberes para uma cidadania planetária, denominadas ‘crisálidas do pensamento complexo’, como estruturas itinerantes para a promoção de cursos de extensão, formação e atualização do professorado dos diversos níveis de ensino, espaços criativos e não dogmáticos empenhados na discussão da diversidade de saberes e modos de existência que transformem a escola num laboratório para uma educação verdadeiramente democrática.

  6. Solicitamos, finalmente, ao Governo Federal, aos Governos Estaduais e Municipais, assim como a todos os representantes e líderes políticos, intelectuais, acadêmicos, professores, empresários, trabalhadores, responsáveis pelos meios de comunicação dos países que prestem atenção especial às propostas contidas na presente Carta e as levem em consideração no momento de planejar e realizar seus programas e projetos.

Redatores:

Maria Cândida Moraes

Juan Miguel Batalloso Navas

Edgard de Assis Carvalho

Rosamaria de Medeiros Arnt

 

De acordo:

Ubiratan D´Ambrósio, Maria Conceição de Almeida, Izabel Petraglia...

 

 




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